Brincadeira de criança virou paixão e biólogo se tornou curador do maior aquário de água doce do mundo
Aos 6 anos de idade, um tanque de lavar roupa cheio de água e três peixinhos de brinquedo foram suficientes para despertar uma paixão avassaladora que virou profissão. Hoje, aos 38 anos, o biólogo curador do Bioparque Pantanal, Heriberto Gimênes Junior, garante que uma brincadeira de criança, despretensiosamente orquestrada por seus pais, foi tudo que ele poderia desejar na vida.
Ilustrada por muito conhecimento e determinação, sua história é relembrada nesta quarta-feira (3), no Dia do Biólogo, em “Bioparque Pantanal: histórias que inspiram”.
“Eu me lembro muito bem. Eu estava em um tanque de lavar roupa, cheio de água, e meus pais colocaram peixinhos de brinquedo. Eu dava corda neles e eles saiam nadando. Eu fiquei encantado”, relembra com alegria.
Entre tantas memórias, Heriberto relata que todas eram inundadas dos fascinantes animais aquáticos, com o perdão do trocadilho. No aniversário de 8 anos, o biólogo ganhou seu primeiro aquário e a festa, cheia de convidados, bolo e docinhos, virou só um detalhe.
“Eu passei a festa inteira olhando para os animais e não conversei com ninguém. Foi até um problema para os meus pais”, brinca o biólogo. “Desde pequeno sempre fui apaixonado por animais, mas especificamente por peixes. Já são 30 anos em contato com esses animais”.
Da infância à adolescência, a paixão aumentava e o entusiasmo foi tomando novas proporções, lembra Heriberto. Aos 12 anos ele já sabia com afinco o que almejava e naquele momento até mesmo a família precisava encarar sua paixão. Os pais de Heriberto, ao voltarem de uma viagem, encontraram em casa uma piscina de plástico e uma caixa d’água cheias de peixes, lembra ele entre risos.
O menino apaixonado por peixes deixava de lanchar na escola para alimentar uma paixão. O dinheiro do ônibus se transformava em longas caminhadas até as lojas de animais e sua coleção aumentava cada dia mais.
“Eu guardava o dinheiro da minha merenda da escola, eu deixava de comer, e economizava o dinheiro do ônibus também, e ia andando até as lojas para comprar peixes. Foi assim por muitos e muitos anos. Onde desse para colocar em casa, eu colocava. E quando eu disse que queria fazer biologia para trabalhar com esses animais, meus pais tiveram essa sensibilidade de me estimular com essa paixão”.
Cascudos
Em determinado momento, ainda na adolescência, uma espécie passou a lhe chamar mais atenção, o cascudo. “Eu coletava peixes próximo da minha casa, além daqueles que eu comprava. E eu sempre coletei cascudo e então nasceu essa minha paixão especial por essa espécie”.
Heriberto conta que ganhou os primeiros cascudos, coloridos, da avó. “Na época, compramos pela internet, e ali eu tive certeza que faria biologia para poder trabalhar com esse grupo de peixes”.
Vida acadêmica e profissional
Em 2005 Heriberto ingressou em Ciência Biológicas, na Universidade Anhanguera Uniderp e no último ano do curso surgiu uma oportunidade profissional que não foi desperdiçada.
“Tranquei a faculdade porque surgiu a possibilidade de trabalhar com cascudos no Pará, na região da Amazônia. Novamente meus pais me apoiaram. Então eu passei um ano trabalhando com esses animais e com pesquisadores especializados nesse grupo de peixes (cascudos) na região”.
Ao voltar para Campo Grande, Heriberto terminou o curso de Ciências Biológicas e iniciou o mestrado em Biologia Animal, na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS).
“Fiz meu mestrado e trabalhei com monitoramento de peixes, e sempre com aquários em casa, sempre com esse foco. Trabalhei em lojas de aquário e gastava meu salário comprando novos moradores para o aquário e, às vezes, nem recebia meu salário porque gastava tudo com os eles”
Hoje ele comanda, no maior aquário de água doce do mundo, 19 técnicos – biólogos, zootecnista, médico veterinário, oceanógrafo, químico e engenheiro de aquicultura.
“Hoje a minha função é gerenciar toda essa equipe que cuida de todo esse acervo de peixes, não só da exposição (circuito externo), mas também da parte de pesquisa do Centro de Conservação. Cuidamos de 468 espécies, cerca de 40 mil animais que habitam o Bioparque Pantanal”.
Segundo ele, o trabalho é específico para atender as necessidades nutricionais, comportamentais, sanitárias e até a qualidade de água, tudo para trazer qualidade de vida para os peixes e os outros animais.
Heriberto x Bioparque
Antes mesmo do Bioparque Pantanal existir, como conhecemos hoje, havia um projeto antigo de aquário para a Capital. “Nessa época ainda nem estava na faculdade, mas já dizia que gostaria de trabalhar no aquário”.
Já formado, em 2011, Heriberto foi chamado para trabalhar em um programa chamado “Biota MS” (Programa Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação) para trabalhar em uma lista de espécies que iriam compor o então aquário de água doce, que viria a ser o Bioparque.
“Em 2014 começamos a receber alguns animais de coleta e ficamos até 2022 cuidando desses animais em outro laboratório, que era o Laboratório de ictiologia do Imasul ((Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul). Naquele momento ainda não sabíamos se o Bioparque iria inaugurar ou não. Era uma incerteza. Mas quando soubemos que a obra realmente iria voltar e os peixes viriam para o aquário foi muito marcante na minha vida, já que traríamos esses animais para o maior aquário de água doce do mundo”, conta.
Heriberto se emociona ao dizer que “hoje, quando as pessoas veem os animais no circuito, são animais com mais de 10 anos de idade. E para nós, olhar para aqueles peixes e cuidar deles é uma satisfação sem precedentes”.
O biólogo, apaixonado, garante que muito estudo o levaram à função que ocupa hoje, e ele assegura que sua felicidade não poderia estar em outro local.
“ Tive uma infância difícil e me senti sozinho em muitos momentos e os peixes fizeram com que eu não me sentisse assim. De alguma forma me conectei com esses animais e aquilo me trazia um acalento, um acolhimento que eu não tinha como explicar. Jamais seria feliz atrás de uma mesa, esperando um horário para ir embora. Se não existisse o Bioparque, eu, com certeza, estaria em uma universidade fazendo pesquisa, mas com peixes, com certeza, sempre com eles”.
Luciana Brazil, Comunicação Bioparque Pantanal
Foto de capa: Bruno Rezende/Secom